Há muito desconhecimento quanto ao Magnetismo Animal. Originalmente, ele nada tem a ver com a concepção popular atualmente divulgada.
O termo “magnetismo animal” foi criado pelo médico alemão Franz Anton Mesmer (1734 – 1815).
como um novo paradigma da física de então para fundamentar sua
renovação da ciência médica, já que ele considerava falsa a teoria
aceita pela comunidade científica de sua época — uma teoria mecanicista
para as forças (luz, eletricidade, magnetismo, eram consideradas
matérias, esferas duras, sem peso e invisíveis). Para Mesmer, porém, as
forças seriam ondas, vibrações de um elemento primordial (o fluido cósmico universal,
termo também proposto por ele). Segundo ele, cada uma das diversas
faixas vibracionais do fluido universal impressionava os nossos sentidos
físicos, como a luz para o olho e o ar para os ouvidos. Desse modo, o
“magnetismo animal”, segundo ele, seria o meio de comunicação entre a vontade do
magnetizador e o paciente, um estado de vibração do fluido cósmico
universal acima da luz (que na época era o mais sutil fenômeno),
perceptível por nosso sistema nervoso e pelo senso íntimo, explicando
assim os efeitos do tratamento pelo passe e os efeitos do sonambulismo
provocado.
Desse modo, o passe curativo não
seria uma simples transmissão de substância (o que a teoria materialista
dos fluidos materiais aceita pelos físicos da época levaria a crer),
como costumeiramente se pensa, mas uma ação dinâmica do organismo
saudável do magnetizador em sintonia com o doente, acelerando o ciclo
natural da cura, como também funciona na medicina homeopática, sendo
assim ambas compatíveis! Isso explica porque o fundador da homeopatia,
Samuel Hahnemann (1755-1843), não só aplicava passes
mesméricos em seus pacientes, combinando-os com os remédios; mas também
acrescentou essa prática à sua medicina, em seu livro Organon da arte de curar.
Depois, no século seguinte, os
espíritos iriam aceitar essa teoria do “fluido universal” proposta por
Mesmer como conceito fundamental da doutrina espírita. Demonstrando a
relevância dessa recuperação, vale lembrar que Kardec considerava
Magnetismo Animal e Espiritismo como ciências irmãs, e que seria
impossível compreender uma sem conhecer a outra.
Os médicos homeopatas da época de Alla Kardec faziam uso do
tratamento de passes do Magnetismo Animal, e grande parte deles era
espírita. Essas três ciências: Espiritismo, Magnetismo Animal e
Homeopatia se afinavam, se uniam, compartilhavam seus fundamentos.
formavam um ambiente cultural propício para a difusão dessas ideias. Uma
pena que, com a virada do século 19 o materialismo dogmático tenha
penetrado na Universidade como uma erva daninha, entranhando-se e
encobrindo as conquistas científicas espiritualistas do século anterior.
Está na hora de recuperar para transformar.
O ainda mais surpreendente está no
fato de que, consideradas as diferenças culturais de cada época, as
ideias de Mesmer sobre o fluido universal, considerando as forças como
ondas, é uma antecipação conceitual intuitiva do atual paradigma da
física moderna!
Administrador de empresas, pesquisador e palestrante espírita, autor de Revolução espírita – a teoria esquecida de Allan Kardec, é também autor de Mesmer – a ciência negada e os textos escondidos,
obra que resgatou a ciência do magnetismo animal, considerada por Allan
Kardec ciência irmã do espiritismo. É apresentador do programa de rádio
Universo Espírita – pensar e viver com liberdade.
Para ser espírita é preciso fazer parte de uma sociedade? Participar
de reuniões periódicas? Ter-se formado em cursos de habilitação?
Carregar um diploma? Vamos ver que nada disso é necessário para ser
espírita, como explicou Allan Kardec.
Uma característica importante da autonomia moral, base fundamental da teoria espírita, como pretendemos demonstrar na obra Revolução Espírita,
está no fato de que, por sua própria definição, deve ser adquirida por
um esforço racional a partir de uma iniciativa espontânea e
desinteressada. Dessa forma, ninguém se torna moralmente livre se for
catequizado ou doutrinado. Também não é possível identificar um
indivíduo autônomo e responsável somente por seus atos (sem conhecer as
intenções), por meio de um diploma ou insígnia, ou sua participação numa
congregação ou confraria.
Mesmo a Sociedade Parisiense, presidida por Kardec, estando
“alinhada oficialmente entre as sociedades científicas, não é nem uma
confraria, nem uma congregação, mas uma simples reunião de pessoas
ocupando-se do estudo de uma ciência nova que ela aprofunda” (Revista
Espírita 1863, p.122). Quanto às relações entre a Sociedade de Paris e
as outras sociedades com as quais se correspondia, havia a mais completa
independência: “O laço que as une é, pois, um laço puramente moral,
fundado sobre a simpatia e a semelhança das ideias; não há, entre elas,
nenhuma filiação, nenhuma solidariedade material” (Revista Espírita 62,
p.110).
O que faz um espírita, então?
Segundo Kardec, “quem partilha nossas convicções a respeito da
existência e da manifestação dos espíritos, e das consequências morais
que disso decorrem, é Espírita de fato” (Revista Espírita 64, p.130).
Por isso, “as sociedades não são de nenhum modo uma condição necessária à
existência do espiritismo”, afirma, e se “elas se formam hoje, que
cessem amanhã, sem que a sua marcha seja entravada no que quer que
seja”, pois “o espiritismo é uma questão de fé e de crença e não de
associação”.
Basta estar de acordo com os princípios fundamentais da doutrina espírita para ser espírita. Paulo Henrique de Figueiredo
Paulo Henrique de Figueiredo
Administrador de empresas, pesquisador e palestrante espírita, autor de Revolução espírita – a teoria esquecida de Allan Kardec, é também autor de Mesmer – a ciência negada e os textos escondidos,
obra que resgatou a ciência do magnetismo animal, considerada por Allan
Kardec ciência irmã do espiritismo. É apresentador do programa de rádio
Universo Espírita – pensar e viver com liberdade.
O Jovem Rivail passou sua infância e juventude na casa de sua avó
materna, Charlotte Bochard, na cidade francesa de Bourg-en-Bresse, no
departamento de Ain. Vinha de uma importante família, tendo sido o seu
avô, o patriarca Benôit Marie Duhamel, préfet do departamento de Ain (cargo equivalente ao de governador de estado).
A cidade de Bourg, no decorrer dos séculos, era um destino de viagem
muito apreciado pelos franceses, e foi frequentada por reis, nobres,
também por Napoleão Bonaparte, e muitas famílias de férias. Os bressans,
como eram conhecidos seus moradores, tinham a fama de serem reservados,
mas bastante receptivos e hospitaleiros, quando sua proximidade fosse
conquistada.
A casa da família Duhamel era uma Maison de maître, casa
típica das famílias mais abastadas daquela época, como os profissionais
liberais e a elite rural. Eram construídas em três pavimentos. O
primeiro abrigava as salas, cozinha, sala de jantar, áreas de serviços.
No segundo andar localizava-se a área íntima, como quartos. Por fim, um
sótão ocupara o terceiro pavimento. Sua fachada possuía três fileiras de
janelas e uma grande porta de entrada que tinha acesso por uma pequena
escadaria.
A Maison onde viveu Rivail era bastante ampla. Havia um
grande pátio, estábulos para animais, e em suas proximidades diversos
terrenos serviam à produção agrícola. Ficava numa região mais afastada
do centro urbano da cidade, e os costumes eram típicos da vida que se
leva hoje nos sítios e fazendas. Tirar leite das vacas, produzir queijo,
colher legumes e verduras na horta, dar comida aos animais. As
cercanias comportavam um ambiente bucólico e agradável, o que nos remete
a uma infância rica de oportunidades de aprendizado para aquele esperto
e inteligente menino.
Em 1828, aos 24 anos, em seu livro: Plano para melhoria da Educação Pública da França,
o jovem Rivail iria escrever sobre as condições ideias para a educação
infantil: “teria suposto este pequeno estabelecimento não em Paris, mas
numa bela região, onde as satisfações da vida campestre seriam unidas às
ocupações sérias”. As aulas seriam “de história natural no campo, de
instruí-los em conversações, durante passeios. Teria aconselhado o
educador fazer seus alunos viajarem, para estudarem, eles próprios, os
costumes dos povos e visitar os lugares históricos”.
Ou seja, ao escrever essas palavras, o jovem professor Rivail estava
certamente lembrando-se de episódios de sua própria infância. Paulo Henrique de Figueiredo
Paulo Henrique de Figueiredo
Administrador de empresas, pesquisador e palestrante espírita, autor de Revolução espírita – a teoria esquecida de Allan Kardec, é também autor de Mesmer – a ciência negada e os textos escondidos,
obra que resgatou a ciência do magnetismo animal, considerada por Allan
Kardec ciência irmã do espiritismo. É apresentador do programa de rádio
Universo Espírita – pensar e viver com liberdade.
A base fundamental da revolução espírita está no estabelecimento da
autonomia moral como base da educação e das relações sociais humanas.
Mas o que é autonomia moral?
Afirma-se na Revista Espírita de 1870, página 91:
“O estado de direito, a autonomia da consciência individual, o
progresso moral e intelectual, o reinado do amor e da justiça, será o
futuro para o qual o espiritismo dá a base fundamental”.
Tradicionalmente, as religiões positivas, a escola tradicional e os
governos, desde o inicio da civilização, submetem as pessoas à
autoridade pela obediência passiva, ditando o modo de agir sob o regime
do castigo e da recompensa, conforme o princípio da heteronomia. Segundo
a visão dogmática do cristianismo, todos são pecadores, os que não
forem salvos, após o julgamento final, sofrerão eternamente no inferno.
Os salvos vivenciarão a plenitude do céu. Neste pensamento, há
dependência, submissão, obediência cega quanto ao indivíduo. E,
coletivamente, na comunidade heterônoma, há segregação, competição,
divisão. Alguns se consideram melhores do que os outros.
Isso não é novidade para ninguém! Não só essa orientação foi imposta pelas religiões tradicionais
como sendo a relação com Deus, como também a sociedade materialista
impõe a competição, segregação entre uma minoria superior e a grande
massa considerada subserviente. Nas escolas, as crianças competem para
serem as melhores, as que não se desempenham bem são castigadas. A moral
heterônoma é o padrão das relações sociais.
Por sua vez, a autonomia moral e intelectual pressupõe o uso da razão
e do senso moral para o autogoverno e o desenvolvimento da
personalidade. Essa será a grande mudança que transformará o mundo!
Quando as pessoas se relacionam de forma autônoma, há um respeito
bilateral, ocorre a cooperação e o apoio mútuo, e não por competição. Há
uma valorizão da diversidade, e por isso a inclusão se torna natural.
Não há medo de errar, mas a tentativa é que leva ao conhecimento. Cada
indivíduo tem seu valor, sua contribuição, algo que o torna relevante.
Todos merecem, enfim, a igualdade de oportunidades!
Enquanto pensadores como Rousseau, Kant, Piaget, Paulo Freire,
fundamentaram a educação pela liberdade como fator de transformação da
humanidade, o espiritismo revela que a autonomia é a lei natural que
rege a relação do espírito com a humanidade universal. Ou seja, é
fantasiosa a ação arbitrária de Deus castigando ou recompensando, como
se ajuizava nas doutrinas religiosas e sociais do velho mundo.
A moral espírita se fundamenta na autonomia moral, essa é a questão
central dessa proposta filosófica moderna. Desse modo, o Espiritismo
apoia todas as iniciativas que concorrem para esse objetivo. Será esse o
caminho pelo qual ocorrerá a regeneração da humanidade, pelo esforço
voluntário de cada um!
Mãos à obra.
Paulo Henrique de Figueiredo
Paulo Henrique de Figueiredo
Administrador de empresas, pesquisador e palestrante espírita, autor de Revolução espírita – a teoria esquecida de Allan Kardec, é também autor de Mesmer – a ciência negada e os textos escondidos,
obra que resgatou a ciência do magnetismo animal, considerada por Allan
Kardec ciência irmã do espiritismo. É apresentador do programa de rádio
Universo Espírita – pensar e viver com liberdade.
Nasceu em
23 de maio de 1734, em
Iznang, aldeia próxima
do lago de
Constança, filho do
casal Franciscus Antonius Mesmer e
Maria Ursula Michel, membros de
uma grande família católica da
Suábia, região que hoje
pertence à
Alemanha. Mesmer
desencarnou em
5 de março de 1815.
Em 1743, foi levado
pelos pais para o
monastérioReichenau, em
Constança, onde durante
seis anos estudou línguas,
literatura clássica e
música com os
monges. Provido
de recursos, dedicou-se a longos
estudos científicos, chegando a
dominar os conhecimentos de seu
tempo, época de acentuado orgulho
intelectual e ceticismo. Era um
trabalhador incansável, calmo,
paciente e ainda um exímio músico.
Freqüentava constantemente
círculos ocultistas, locais onde
obteve conhecimentos de alquimia.
Estudou com profundidade a vida e a
obra de Paracelso (1493-1541), que
entendia que havia correspondência
entre o mundo exterior
−
o
macrocosmo
−
e as diferentes
partes do organismo
−
o
microcosmo.
Em 1750, ingressou
na Universidade
jesuíta de
Dillingen, na
Bavária, onde estudou
filosofia por quatro
anos, chegando ao doutorado. Leu
as obras de
Galileu,
Descartes,
Leibniz,
Kepler,
Newton etc. Em 1754,
iniciou o curso de
teologia na
Universidade de
Ingolstadt, também na
Bavária. Cinco anos
depois, em 1759, ingressou na
Universidade de
Viena, dedicando seu
primeiro ano nesta universidade ao
estudo das leis. Transferiu-se,
logo depois, para o curso de
medicina. Seis anos depois, no dia
27 de maio, conquistou o doutorado
com uma
dissertação inspirada
na obra de Newton e talvez de
Paracelso. Nesse texto,
que trata da influência dos
planetas sobre o corpo humano,
usou pela primeira vez o conceito
de
fluido universal.
A tese de
formatura de Mesmer fazia
referência a uma medicina de
outros tempos: De Influxo
Planetarum In Corpus Humanum.
Nela, descrevia a influência dos
planetas por intermédio de um
fluido universal com poderes
magnéticos sobre a matéria viva.
Aludia, também, ao magnetismo
animal, que, segundo ele, existia
em duas formas opostas e tenderia
a emanar dos lados direito e
esquerdo do corpo humano.
Explicava que a cura das
enfermidades consistia na
restauração do equilíbrio ou
harmonia alterada entre os
fluidos. Com base nessas teorias,
Mesmer construiu sua técnica
terapêutica utilizando a fixação
dos olhos e os passes com as
mãos. As teorias de Mesmer
afirmavam que um princípio
imponderável atuava sobre os
corpos. Em todo o organismo
vivente existia um fluido
magnético no qual circulava uma
força especial, animando tanto o
mundo orgânico como o inorgânico;
que esse fluido se transmitia,
podendo revigorar os corpos
debilitados; que as pessoas
dotadas de grande vitalidade
poderiam transmitir essa energia
para os outros, se soubessem
dirigi-la, utilizando as mãos.
O primeiro
tratamento pelo
magnetismo animal teve
início em 1773. A paciente foi uma
parenta da esposa de
Mesmer e amiga da
família de
Mozart, Franziska
Esterlina, uma senhorita de 29
anos bastante debilitada. Mais
tarde, em 1790,
Mesmer foi homenageado
por
Mozart, em sua ópera Così fan tutte. No
final do primeiro ato, a
personagem Despina, fantasiada de
médico, imita
Mesmer e seu
tratamento.
Em 1775, com a
pouca acolhida dada à sua
descoberta, determina-se a nada
mais realizar publicamente em
Viena. Após
muitas experiências, reconhece que
pode curar mediante a aplicação de
suas mãos. Acredita que dela se
desprende um fluido que alcança o
doente. De todos os corpos da
Natureza – declarou então
−, é o
próprio homem que com maior
eficácia atua sobre o homem. A
doença seria apenas uma desarmonia
no equilíbrio da criatura. Ele,
que nada cobrava pelos
tratamentos, preferia cuidar de
distúrbios ligados ao sistema
nervoso. Além da imposição das
mãos sobre os doentes, para
estender o benefício a maior
número de pessoas, magnetizava
água, pratos, cama etc., a cujo
contato submetia os enfermos.
Ele definiu o
magnetismo animal como
sendo a capacidade de um indivíduo
causar efeitos similares ao
magnetismo mineral em
outra pessoa. Em 1776,
Mesmer deixa de fazer
uso do
ímã como simples
condutor do
magnetismo animal, para
evitar mal-entendido por parte dos
médicos e físicos. Continua a usar
água, garrafas, barras
de
ferro. No ano seguinte,
aceita como paciente a famosa
pianista
Maria Theresa Paradis,
curando sua
cegueira, fato que
gerou muitas controvérsias.
Na luta pela
divulgação do
Magnetismo Animal,
Mesmer chega a
Paris no mês de
fevereiro de 1778 e
começa a apresentar suas
descobertas para os sábios e os
médicos dessa capital,
retirando-se para a cidade de
Creteil no mês de
maio, juntamente com
alguns doentes. Requisita
comissários da
Sociedade Real de Medicina
de
Paris para que eles
fiscalizem as curas, o que foi
recusado. Mesmer praticou
durante anos o seu método de
tratamento em Viena e em Paris,
com evidente êxito, mas acabou
expulso de ambas as cidades pela
inveja e incompreensão de muitos.
Depois de cinco tentativas para
conseguir exame judicioso do seu
método de curar pelas academias, é
que publica, em 1779, a
Dissertação sobre a descoberta do
magnetismo animal, na qual afirma
que este é uma ciência com
princípios e regras, embora ainda
pouco conhecidas. Suas descobertas
baseavam-se em 27 teses. Eis
algumas:Por meio deste fluido,
doenças nervosas são curadas
imediatamente e suas virtudes
podem estender-se à cura universal
e a preservação da humanidade, a
um grau tão elevado, que não se
sabia quão longe poderia ir.
Existe uma influência recíproca
entre os corpos celestes, a Terra
e todos os organismos animados. O
fluido universal é o agente dessa
influência. Essa ação recíproca
está sujeita às leis da mecânica.
Os corpos gozam de propriedades
análogas ao ímã. Essas
propriedades podem ser
transmitidas a outros corpos
animados ou inanimados. A moléstia
é apenas a resultante da falta ou
desequilíbrio na distribuição do
magnetismo pelo corpo.
O trabalho de
Mesmer, devido a seus métodos e a
essas curas miraculosas, provocou
um alvoroço em Paris. Ali foi
cultuado por muitos e perseguido
por outros, principalmente por
colegas médicos que o chamavam de
charlatão e embusteiro. Sua
popularidade prosseguiu por muitos
anos, mas outros médicos o
tachavam de impostor e charlatão.
Em uma derradeira
tentativa, propõe à
Faculdade de Medicina
de
Paris, em 1780, um
teste comparativo de seu método
com a
medicina tradicional.
Em 18 de
setembro, houve uma
assembléia geral e, após uma
leitura e um discurso,
d'Eslon, seu discípulo,
foi excluído do quadro dos médicos
e as
proposições de
Mesmer foram rejeitadas
com desdém e animosidade. Depois,
em 1781,
Mesmer publica o que
viria a ser a mais importante
descrição histórica da ciência do
magnetismo animal.
Em 1784, o governo francês
nomeou uma comissão de médicos e
cientistas para investigar suas
atividades. Benjamin Franklin foi
um dos membros dessa comissão, que
acabou por constatar a veracidade
das curas, porém as atribuiu não
ao magnetismo animal, mas a outras
causas fisiológicas desconhecidas.
Mesmer envia uma carta
a
Benjamin Franklin
denunciando os equívocos da
comissão nomeada para examinar
d'Eslon, desautorizada para
agir em seu nome, e a
impropriedade do
método adotado. O rei
da
França nomeia uma
comissão de sábios da
Academia de Ciências de Paris
−Bailly,
Darcet,
Franklin,
Lavoisier
−, que em
quatro meses concluiu que as
proposições de
Mesmer não passavam de
imaginação, além de
redigir um relatório secreto
alegando implicações sexuais. Uma
outra comissão formada por médicos
da
Sociedade Real de Medicina
também rejeitou a existência do
magnetismo animal.
Porém, um de seus membros,
Jussieu, divergiu dos
colegas e admitiu as curas. Em
1785, alguns dos discípulos de
Mesmer publicam as
anotações de suas aulas. Em 1790,
sua esposa, von Posh, morre de
câncer no seio. De
retorno a
Viena, em 1793, é preso
pela polícia, pois estava sendo
investigado por questões
políticas, suspeito de ser
favorável aos
jacobinos. Liberado,
ficou sob custódia até 5 de
dezembro. Continuaria,
porém, sendo observado pelas
autoridades.
Mesmer vê-se então forçado a
retirar-se de Paris e, vilipendiado, instala-se
numa pequena cidade suíça, onde
viveu durante 20 anos sempre
servindo aos necessitados e sem
nunca desanimar nem se queixar.
Um grupo de
médicos da Academia de
Berlim redescobre o seu
paradeiro, mas, já com setenta e
cinco anos, ele não aceita
acompanhá-los. Em 1812, aos
78 anos, a Academia de Ciências de
Berlim convida-o para prestar
esclarecimentos, pois pretendia
investigar a fundo o magnetismo.
Era tarde; ele recusou o convite.
Também a Igreja condenava o
magnetismo, e, por tabela, a ele.
Em 1813, um teólogo francês
escrevia que "o sonambulismo e o
magnetismo eram sobrenaturais e
diabólicos, anticristãos,
anticatólicos e antimorais. Tudo
provinha da ação de fluidos de
origem infernal". A Academia
encarrega o Prof. Wolfart de
entrevistá-lo. O depoimento desse
professor é um dos mais belos a
respeito do caridoso médico:
Encontrei-o dedicando-se ao
hospital por ele mesmo escolhido.
Acrescente-se a isso um tesouro de
conhecimentos reais em todos os
ramos da Ciência, tais como
dificilmente acumula um sábio, uma
bondade imensa de coração que se
revela em todo o seu ser, em suas
palavras e ações, e uma força
maravilhosa de sugestão sobre os
enfermos. No início de 1814, ele
regressou para Iznang, sua terra
natal, onde permaneceria os seus
últimos dias até falecer em 5 de
março de 1815,
aos 81 anos de idade.
Atualmente, a questão da homossexualidade está amplamente presente no
debate cultural. Com o passar das décadas, o preconceito e o ódio,
apesar de ainda presentes, estão progressivamente se restringindo, e, ao
menos a aceitação, já está presente nos hábitos cotidianos. Notícias
episódicas da mídia relatam cenas de ataques e intolerância, no entanto,
muito mais amplamente reconhecido é o fato de que os casais
homossexuais podem agir com naturalidade em muitas áreas públicas, lutar
por direitos iguais nas instâncias do poder, debater a questão
abertamente; o que seria inaceitável em séculos anteriores.
O nazismo é um marco histórico que demonstra quanto o preconceito e a
ideia de supremacia faz do homem um animal doente, enfurecido pela
raiva, aceitando a perseguição aos inocentes em nome de uma falsa
“superioridade”. Contagiando inclusive as multidões, que permaneceram
inertes frente aos abusos criminosos de seus dirigentes. Esse fenômeno,
porém, não
se restringiu à perseguição aos judeus, narrado pelo holocausto, mas
também a outros grupos, como os homossexuais, considerados doentes pelos
nazistas.
Marcados em sua roupa por um triangulo rosa invertido, nos
campos de concentração eles foram tratados por médicos nazistas que
tentavam “curá-los” por métodos brutais e perversos, como injeções de
hormônio masculino e frequência forçada a prostíbulos criados para tal
objetivo. Os “curados” eram enviados para combater os russos, absolvidos
pelo “bom comportamento”. Os demais, cerca de 5 a 15 mil, foram mortos
nas câmaras de gás.
Em momento mais recuado, no século 19 vivido por Kardec, frente ao
domínio social das classes burguesas após a revolução francesa, a
distinção entre sexos ganhava importância para justificar e impor
diferenças entre os comportamentos femininos e masculinos, usadas
explicação para as exigências daquela nova sociedade. O preconceito
estava presente na ciência quando se buscava legitimar uma superioridade
masculina como sendo biologicamente natural, baseada no senso comum da
diferença entre os “gêneros”.
Cabia à mulher, como “sexo frágil”,
conquistar um bom casamento, cuidar dos filhos e da casa, ficando longe
de qualquer função pública. Cabia ao homem usufruir do poder dado pela
natureza ao “sexo forte”.
Uma falsa teoria, objetivando explicar pela
ciência o que, em verdade, se trata de uma distorção cultural.
Enquanto
na universidade as possibilidades da ciência abriam grandes perspectivas
para o futuro entusiasmando os rapazes, as mulheres eram completamente
afastadas do estudo acadêmico, mantidas sob uma educação antiquada,
limitante. É importante lembrar: saber é poder! Louisa Garrett, deu o seguinte depoimento:
“Permanecer solteira era considerado uma desgraça e aos
trinta anos uma mulher que não fosse casada era chamada de velha
solteirona. Depois que seus pais morriam, o que elas podiam fazer, para
onde poderiam ir? Se tivessem um irmão, poderiam viver em sua casa, como
hóspedes permanentes e indesejados. Algumas tinham que se manter e,
então, as dificuldades apareciam. A única ocupação paga aberta a essas
senhoras era a de governantas, em condições desprezadas e com salários
miseráveis. Nenhuma das profissões eram abertas as mulheres; não havia
mulheres nos gabinetes governamentais; nem mesmo trabalho de secretaria
era feito por elas”.
(http://www.recantodasletras.com.br/artigos/3511571)
E sobre a educação nas instituições de ensino no século 19, Louisa explicou:
“Os pais acreditavam que uma educação séria para suas
filhas era algo supérfluo: modos, música e um pouco de francês seria o
suficiente para elas. Aprender aritmética não ajudará minha filha a
encontrar um marido, esse era um pensamento comum. Uma governanta em
casa, por um breve período, era o destino habitual das meninas. Seus
irmãos deviam ir para escolas públicas e universidades, mas a casa era
considerada o lugar certo para suas irmãs. Alguns pais mandavam suas
filhas para escolas, mas boas escolas para garotas não existiam. Os
professores não tinham boa formação e não eram bem educados. Nenhum
exame público (para escolas) aceitava candidatas mulheres”.
É preciso mergulhar no passado, por meio dos depoimentos e descrições de fontes primárias para recuperar como
era a cultura nesse período, pois nossas referências atuais são
completamente diferentes. Nas escolas da atualidade, meninos e meninas
agem igualmente, recebem os mesmos tratamentos e oportunidades. O mesmo
ocorre nas universidades, e, pouco a pouco, as mulheres vão ganhando
espaço nos esportes, na política, e demais cenários sociais. Todavia, no
século 19 tudo isso era impensável. Poucas mulheres tinham acesso a uma
educação primária, apenas as pertencentes às famílias mais abastadas,
as quais, ainda assim, encontravam o seguinte ambiente escolar, no
depoimento de Teresa Billington, em sua autobiografia de 1884:
“Nós nos sentávamos e ficávamos silenciosas em nossas
fileiras de carteiras, aprendíamos dos livros e nossas tarefas eram
corrigidas por uma freira, que era a professora naquele momento, a
partir das respostas na parte final de um livro similar ao nosso… Nós
tínhamos longos períodos de instrução religiosa… Sexta feira a tarde era
devotada exclusivamente a comportamento. Os Modos fazem uma dama nos
era dito, não o dinheiro ou o ensino, não a beleza. Então praticávamos
como abrir uma porta, entrar e sair de um cômodo; a trazer uma carta,
uma mensagem, uma bandeja ou um presente; a pedir permissão às mães de
nossas amigas para que elas pudessem participar de uma festa; a receber
visitas na ausência de nossos pais, e assim por diante!”
Ou seja, nesse tempo, a mulher era destinada à procriação e a servir
ao homem, e sua melhor qualidade estava em ser submissa. Como vimos, uma
radical distinção se opunha ao se adotar o conceito de gêneros .
Esse já é um problema fundamental a ser debatido. E quanto ao tema
deste artigo, a homossexualidade? Foi desde essa época, com o auxílio de
uma ciência preconceituosa e equivocada, que o homossexual passou a ser
qualificado numa categoria de inversão doentia, antinatural e perversa:
a aberração de ser homem por natureza, mas comportar-se como a inferior
mulher, subvertendo as funções sociais consideradas naturais. Uma
degeneração, perversidade, monstruosidade. O estudo de J. F. Costa, A Face e o Verso: estudos sobre o homoerotismo II (São Paulo: Escuta, 1995), define essa situação do século 19:
“Sua inversão será perversão porque seu corpo de homem
será portador da sexualidade feminina que acabara de ser criada. O
invertido apresenta um duplo desvio: sua sensibilidade nervosa e seu
prazer sexual eram femininos. Se sexo foi, por isso mesmo, definido como
contrario aos interesses da reprodução biológica”.
A existência do homossexual era referida como “sodomia”, “pecado
nefando”, “pederastia”. O autor de “O retrato de Dorian Grey”, Oscar
Wilde (1854-1900), por ter se apaixonado pelo lorde inglês Alfred
Douglas, filho do marquês de Queensberry, sofreu duramente as
consequências de sua ousadia. Em 1895, o marquês foi ao tribunal
acusando o escritor de homossexualidade. Em meio à sua defesa, Oscar
Wilde escreveu:
“Tal amor é tão mal compreendido neste século que se
admite descrevê-lo como o ‘amor que não ousa dizer seu nome’. Ele é
bonito, é bom, é a mais nobre forma de afeição. Não há nada nele que
seja antinatural. O mundo não compreende que seja assim. Zomba dele e às
vezes, por causa dele, coloca alguém no pelourinho.”
Oscar Wilde, que sempre negou as acusações, foi condenado a dois anos
de trabalhos forçados pela prática de “indecência grave”. Sua família o
abandonou, seus filhos mudaram de sobrenome. Depois de cumprir a pena, o
escritor foi para o exílio em Paris. Estava execrado socialmente,
falido, solitário e debilitado fisicamente. Foi morar em hotéis baratos,
e, aos 46 anos, morreu, sendo primeiramente enterrado como indigente.
Apenas décadas depois é que veio a repercussão internacional, a
exposição na imprensa, e a visibilidade tornou o caso de Wilde um marco
na luta pelos direitos dos homossexuais.
Foi nesse ambiente cultural que Allan Kardec elaborou a ciência
espírita, estabelecendo o diálogo entre os homens e os espíritos,
formalizando na Doutrina Espírita os ensinamentos dos espíritos
superiores. A Revista Espírita, publicada e elaborada
pessoalmente por ele todos os meses desde 1858, era o laboratório onde
se ensaiavam os temas, ouvindo as opiniões dos pesquisadores espíritas e
as mensagens espirituais recebidas por centenas de médiuns em todo o
mundo.
Em abril de 1862, Kardec evocou o senhor Sanson, um espírita da
Sociedade de Paris, recém-desencarnado, e lhe fez a seguinte pergunta:
“Os Espíritos não têm sexo; entretanto, como há poucos
dias ainda era homem, tende em vosso novo estado antes a natureza
masculina do que a natureza feminina? Ocorre o mesmo com um Espírito que
tivesse deixado seu corpo há muito tempo?”
E, por meio do médium, Sanson respondeu:
“Não temos que ser de natureza masculina ou feminina: os
Espíritos não se reproduzem. Deus os cria à sua vontade, e se, por seus
objetivos maravilhosos, quis que os Espíritos se reencarnem sobre a
Terra, deveu acrescentar a reprodução das espécies para macho e a fêmea.
Mas o sentis, sem que seja necessária nenhuma explicação, os Espíritos
não podem ter sexo.”
Os espíritos sempre ensinaram que eles não têm sexo. Numa nota,
Kardec destacou que “os sexos não são necessários senão para a
reprodução dos corpos; porque os Espíritos não se reproduzem, os sexos
seriam inúteis para eles”. No entanto, o objetivo da pergunta era saber
se Sanson ainda conservava a impressão de seu estado terrestre, de sua
recente condição humana, tão logo após sua morte. Era isso que Kardec
queria saber. Os espíritos superiores sabem e vivenciam lucidamente a
evidência de não existirem diferença entre gêneros, mas os espíritos
mais simples, ainda materializados, conservam as mesmas paixões e
desejos de quando encarnados, e, por isso, acreditam serem ainda homens
ou mulheres depois da morte. Por outro lado, é comum os espíritos se
apresentarem com a imagem que tinham quando encarnados, para faciliar a
sua identificação.
Na Revista Espírita de janeiro de 1866, num inusitado artigo, “As mulheres tem uma alma?”,
Kardec vai tratar novamente das diferenças sociais entre homens e
mulheres. Ele relata que chegava aos jornais a notícia de que uma mulher
havia com sucesso alcançado o grau de bacharel na universidade de
Montpellier, França. Pasmem! Kardec afirma que era apenas o quarto
diploma concedido a uma mulher até então! Em seu artigo, o professor
explica que essa aquisição acadêmica ainda parecia a alguns “uma
monstruosa anomalia”, e que essas conquistas iniciais ainda não
representavam um avanço no entendimento ou um reconhecimento da natural
igualdade, ainda se estava longe disso, considerava-se que se tratava
apenas de uma concessão eventual:
“Depois de ter reconhecido que elas têm uma alma, se lhes
reconheceu o direito de conquistar os graus da ciência, é já alguma
coisa. Mas a sua libertação parcial não é senão o resultado do
desenvolvimento da urbanidade, do abrandamento dos costumes, ou,
querendo-se, de um sentimento mais exato da justiça; é uma espécie de
concessão que se lhe faz, e, é preciso bendizê-la, se lhes regateando o
mais possível”.
Naquele tempo, apesar da questão da existência da alma da mulher ser
considerada ridícula, ainda não se ponderava que a “igualdade de posição
social entre o homem e a mulher fosse de direito natural”, e não uma
concessão feita pelo homem. A contribuição do Espiritismo para o debate é
extraordinária e atual. Enquanto atualmente se discute o fato de que as
tradicionais diferenças de gênero se estabeleceram em função da cultura
e não da natureza fisiológica (visando justificar o poder do homem), o
Espiritismo demonstra o outro extremo da questão: a igualdade é natural,
pois os espíritos não têm distinção sexual! Ou seja, se a divisão de
sexo por gêneros é cultural (se sabe hoje), a igualdade é natural
(explicam os espíritos).
Esse é o ponto fundamental para se compreender o que o Espiritismo
veio acrescentar ao debate! Essa contextualização ou entendimento da
situação cultural de quando Kardec escreveu seus livros e revistas é
primordial para se compreender os fundamentos da Doutrina Espírita. No
tema que agora analisamos, a pergunta essencial é esta: “Deus criou almas machos e fêmeas, e fez estas inferiores às outras?”. E então Kardec esclarece:
“O homem entregue a si mesmo não podia estabelecer a esse
respeito senão hipóteses mais ou menos racionais, mas sempre
controvertidas; nada, no mundo visível, podia lhe dar a prova material
do erro ou da verdade de suas opiniões. Para se esclarecer, seria
preciso remontar à fonte, folhear nos arcanos do mundo extracorpóreo que
ele não conhece. Estava reservado ao Espiritismo resolver a questão,
não mais pelo raciocínio mas pelos fatos, seja pelas revelações de
além-túmulo, seja pelo estudo que ele é capaz de fazer diariamente sobre
o estado das almas depois da morte. E, coisa capital, esses estudos não
são o fato nem de um único homem, nem das revelações de um único
Espírito, mas o produto de inumeráveis observações idênticas feitas
diariamente por milhares de indivíduos, em todos os países, e que
receberam a sanção poderosa do controle universal, sobre o qual se
apoiam todas as doutrinas da ciência espírita. Ora, eis o que resulta
dessas observações. As almas ou Espíritos não têm sexo. As afeições que
as une nada têm de carnal, e, por isto mesmo, são mais duráveis, porque
são fundadas sobre uma simpatia real, e não são subordinadas às
vicissitudes da matéria”.
As almas não têm sexo, ensina o Espiritismo, e a diferença entre o
masculino e o feminino estão relacionadas unicamente à necessidade de
procriação e às funções instintivas e necessárias à preservação da
espécie humana, como ocorre com todas as espécies animais. Afinal, nosso
corpo físico é animal. Isso vem desde os tempos primitivos, quando os
hominídeos concorriam pela sobrevivência. Em sociedade, com o objetivo
de progredir moral e intelectualmente por seu próprio esforço, o
espírito nasce como homem ou mulher, pobre ou rico, senhor ou servidor,
trabalhador do pensamento ou da matéria, buscando vivenciar toda a
diversidade de oportunidades para seu aprendizado. Desse modo, explica
Kardec:
“O Espírito encarnado sofrendo a influência do organismo,
seu caráter se modifica segundo as circunstâncias e se dobra às
necessidades e aos cuidados que lhe impõem esse mesmo organismo. Essa
influência não se apaga imediatamente depois da destruição do envoltório
material, do mesmo modo que não se perdem instantaneamente os gostos e
os hábitos terrestres; depois, pode ocorrer que o Espírito percorra uma
série de existências num mesmo sexo, o que faz que, durante muito tempo,
ele possa conservar, no estado de Espírito, o caráter de homem ou de
mulher do qual a marca permaneceu nele. Não é senão o que ocorre a certo
grau de adiantamento e de desmaterialização que a influência da matéria
se apaga completamente, e com ela o caráter dos sexos. Aqueles que se
apresentam a nós como homens ou como mulheres, é para lembrar a
existência na qual nós os conhecemos”.
Em seu processo evolutivo, na fase inicial de sua trajetória, o
espírito leva e traz influências entre a vida corpórea e a vida
espiritual, sucessivamente. Em espírito, não tem necessidades
fisiológicas materiais, como a diferença de sexo, emoções básicas,
instintos de conservação — pois o espírito é imortal. Todavia, quando
desencarna, muitos espíritos imperfeitos conservam essas características
de forma ilusória no mundo espiritual, demorando a perceber as
diferenças fundamentais de sua nova condição. Só com o passar de muitas
vidas vai compreendendo e se adaptando à essa nova realidade.
O mesmo pode ocorrer, quando o espírito reencarna, propõe Kardec:
“Se essa influência repercute da vida corpórea à vida
espiritual, ocorre o mesmo quando o Espírito passa da vida espiritual à
vida corpórea. Numa nova encarnação, ele trará o caráter e as
inclinações que tinha como Espírito; se for avançado, fará um homem
avançado; se for atrasado, fará um homem atrasado”.
É, enfim, exatamente aqui que, no desenvolvimento desse raciocínio
sobre a influência dos hábitos e tendências do indivíduo mantido vida
após vida nesse estágio inicial do espírito, que surge para Allan Kardec
uma hipótese de causa natural para a condição homossexual. Ele Afirma:
“Mudando de sexo, poderá, pois, sob essa impressão e em
sua nova encarnação, conservar os gostos, as tendências e o caráter
inerentes ao sexo que acaba de deixar. Assim se explicam certas anomalias aparentes que se notam no caráter de certos homens e de certas mulheres”.
É muito importante destacar aqui que o termo “anomalia aparente”,
usado por Kardec, estava presente nas ciências da época, se referindo
aos fenômenos que fogem da explicação das teorias aceitas, não sendo
para elas “normais”; mas que, ao se encontrar uma nova explicação
natural para o fenômeno em novas teorias, elas deixam de ser “anomalias”
e se tornam fenômenos naturais. Por isso ela é “aparente”. Em outra
circunstância, por exemplo, Kardec se referiu à lei da reencarnação como
natural, explicando, enfim, “todas as anomalias aparentes da
vida; é a luz lançada sobre o nosso passado e o nosso futuro, o sinal
manifesto de vossa soberana justiça e de vossa bondade infinita” (O Evangelho segundo o Espiritismo, p. 157).
Podemos concluir, finalmente, que as questões de sexo, considerando
os indivíduos como homens e mulheres, machos e fêmeas, estão
circunscritos à condição material fisiológica dos organismos animais a
que estão associados durante a encarnação. Em sua essência, o espírito
não tem sexo, não tem gênero. Em sua fase inicial de evolução, porém,
essas diferenças permanecem pelos hábitos, tendências e gostos. E são
mantidas pela cultura. Entre os espíritos evoluídos, no entanto, esssas
deixam de ser diferenças, e não há mais qualquer distinção que sustente
preconceitos e disputas de poder. Como a vida espiritual é a principal, e
a evolução será o destino de todos os espíritos, todas as questões
referentes à homossexualidade são circunstanciais, um debate humano,
cultural e temporal; que perderá sentido no futuro, quando a humanidade
houver conquistado uma nova condição evolutiva; tornando-se solidária,
igualitária e livre de preconceitos.
E então Kardec finaliza seu artigo com uma admirável conclusão, colocando o Espiritismo na vanguarda da emancipação da mulher:
“Com a Doutrina Espírita, a igualdade da mulher não é
mais uma simples teoria especulativa; não é mais uma concessão da força à
fraqueza, é um direito fundado sobre as próprias leis da Natureza.
Fazendo reconhecer estas leis, o Espiritismo abre a era da emancipação
legal da mulher, como abre a da igualdade e da fraternidade”.