“Bem-aventurados
os que choram, porque serão consolados” (Mateus, 5:4.)
As
lágrimas extravasam emoções intensas. Choramos quando estamos muito felizes ou
muito amargurados. Não obstante servirem à alegria e à tristeza, convencionou-se
que elas representam os males da existência.
E na
Terra, planeta de expiação e provas, segundo a definição de Kardec, choramos
todos, desde o magnata ao miserável, desde o palácio à choupana.
Jesus
promete que seremos todos consolados. Essa expressão soa quase vazia de
significado. Afinal, é muito pouco, diante dos males maiores, receber algo
parecido com a iniciativa do amigo que toca de leve em nossos ombros, afirmando:
“Não é nada, meu velho! Coragem! Tudo passa!...”
Todavia,
a expressão será bem mais significativa, de alcance bem maior, se lhe
emprestarmos o significado de compensação. Poderíamos dizer, então, que
bem-aventurados são os que sofrem, porque seus males serão compensados por
alegrias futuras.
É da
própria Vida que após a tempestade surja a bonança. Que a noite seja véspera do
dia. Às horas de amargura sucedem-se períodos de tranquilidade. E ainda que a
existência inteira seja uma noite escura de lutas e sofrimentos, experimentaremos
a alvorada gloriosa da imortalidade, ao cessar a existência humana com suas
limitações.
Oferecendo o ensejo de despertamento e resgate, as dores da existência representam
o preço nunca demasiadamente alto que pagamos para o ingresso nas bem-aventuranças
celestes. Seja a dor física, que depura, seja a dor moral, que amadurece, temos
em suas manifestações o cuidado de um mestre inflexível que nos disciplina e
orienta, preparando-nos para assumir a condição de filhos de Deus e herdeiros
da Criação.
É preciso
considerar, contudo, que não basta sofrer, por quanto, se as lágrimas nos
preparam para o Reino dos Céus, que, segundo Jesus, é uma experiência íntima,
uma construção interior, não podemos olvidar que o próprio Mestre situa a
humildade por alicerce fundamental.
Pouco
aproveitaremos de nossas dores sem a consciência de nossa pequenez diante de
Deus, o Pai de sabedoria infinita, que conhece melhor do que nós mesmos nossas
necessidades essenciais e nos oferece experiências que guardam relação não apenas
com nosso merecimento, mas também com o preparo de uma gloriosa destinação.
Os que
vivem a murmurar, que clamam ao Alto por seus males, que se revoltam, que não
se conformam, que se rebelam, estão marcando passo. Suas dores não edificam nem
depuram. Suas lágrimas são ácidas e amargas, gerando males não programados,
amarguras desnecessárias, infelicidade voluntária.
Os
desajustes maiores que afligem a criatura humana não são decorrentes dos
débitos do passado, e sim da rebeldia do presente. Não sofremos tanto pelo
resgate. Afinal, isto deveria ser motivo até de satisfação. A dor maior decorre
do fato de pretendermos recusar o sofrimento. É a lamentável situação do
devedor que marca dia para o credor vir receber seu dinheiro e quando isto
acontece recusa-se terminantemente a pagar.
Seria de
perguntar-se: Quando é que a nossa dor representa resgate do passado sem
complicações para o futuro? Quando é que, por meio dela, estamos realmente
preparando a felicidade futura?
Diríamos
que é quando o nosso comportamento, diante da dor, não gera sofrimento naqueles
que nos rodeiam.
Quantas
famílias atravessam amarguras intensas com alguém doente em casa, não tanto pela
enfermidade e, muito mais, pela inconformação e agressividade do enfermo?!
Quantos
pais derramam lágrimas abundantes em face dos desatinos cometidos por seus
filhos, que se mostram incapazes de suportar com dignidade os embates da
existência?!
Quantos
homens e mulheres amargam anos de convivência com cônjuges neurastênicos e
agressivos porque a Vida não lhes atendeu as solicitações?!
Os que
assim se comportam, espalhando sofrimento porque não sabem sofrer, estão
castigados desde agora pela angústia, que é o clima sufocante em que se debatem
interiormente, adiando para um futuro incerto a edificação de suas almas.
Mas, se
formos tão humildes diante da dor, que jamais acrescentemos naqueles que nos
amam sofrimentos outros além dos decorrentes da convivência com quem sofre, e o
que é mais importante: se conseguirmos transformar nossas experiências com o
sofrimento em exemplos dignificantes de confiança e serenidade, em plena
aceitação da vontade de Deus, então nossos males trarão as marcas abençoadas da
redenção, preparando-nos o ingresso glorioso no Reino dos Céus.
Em
verdade, se tivermos tal disposição, estaremos nele desde agora, ainda que o
sofrimento seja nosso companheiro inseparável.
Richard
Simonetti
Livro A
Voz do Monte.