Conquanto seguisse fielmente as ordenações da Tora, era um Espírito de evolução mais avançada, motivo pelo qual foi citado pessoalmente no Evangelho de João; e interessava-se vivamente pelos acontecimentos religiosos e sociais de sua pátria, mormente no que se referia à vinda tão esperada do Messias nacional.
Além de rabi fariseu, Nicodemo era membro do Sinédrio, órgão político do Colégio Sacerdotal que funcionava como poder legislativo na organização político-judaica, acumulando também as funções de Tribunal Superior, e era composto, em sua maioria, de saduceus, a cuja frente, naquela época, esta a poderosa família de Hanan; era também Nicodemo presidente da sinagoga e da congregação dos cireneus, o que conferia prestigio muito maior no senado-tribunal.
Entre os discípulos de Nicodemo estava Judas de Kerioth, aluno brilhante, porém fanático e de alma mística, sujeito a transes e outra perturbações psíquica, como aliás, também ocorria com Paulo de Tarso.
Assim que o Batista surgiu no Alto Jordão, anunciando o Messias, Judas foi enviado por Nicodemo para examinar os acontecimentos, ouvir opiniões, inteirar-se da verdade e dar parecer sobre o profeta, pessoalmente. Cumprindo sua missão, Judas passou vários dias à roda de João, ouvindo o vendo, sondando a opinião dos escribas e fariseus porventura presentes; mas, quando o profeta ungiu Jesus com o batismo, apontando-o em seguida, com o braço estendido e dizendo aos discípulos e ao povo ali reunido: "Eis o Cordeiro de Deus, que tira os pecados do mundo" e o consagrou como o Messias esperado, dizendo não ser digno de nem mesmo amarrar o cordão de sua sandália, Judas seguiu o Mestre e conseguiu ver-se aceito no rol dos seus discípulos.
Era do mais entusiastas e devotados à pessoas de Jesus e constantemente intimava Nicodemo sobe tudo o quanto se passava.
Por estas informações e outras, obtidas de inúmeras fontes, Nicodemo desde logo compreendeu que aquele rabo galileu não era igual aos outros que conhecia, nem mesmo aos mais renomados; tinha conhecimentos muito acima dos vulgares e possuía poderes psíquicos extraordinários. Assim, pois quando Jesus veio a Jerusalém nessa segunda viagem, já como rabi, Nicodemo esforçou-se em conseguir uma entrevista com Ele, não só para conhecê-lo pessoalmente, como par formar juízo correto e seguro sobre a doutrina que pregava e sobretudo para esclarecer-se a respeito de sua propalada investidura messiânica, feita pelo Batista e que, no momento, era o problema de maior importância e atualidade em toda a nação judaica.
O Evangelho não diz onde tal entrevista realizou-se, havendo diversas versões e suposições, porém, em geral, todos concordam que Nicodemo foi levado à presença de Jesus, a uma casa pobre, junto à Muralha de Davi, na cidade baixa, pois que Jesus não convivia com os poderosos, os ricos e os gozadores.
Essa muralha ficava na parte sul, no local onde se situara a antiga cidade de Davi, a pouca distância da fonte de Siloé, e, em seus muros arruinados se agasalhavam centenas de pessoas do baixo povo que nela cavavam nichos mais ou menos amplos e neles residiam em condições precárias. Um dos mais bem aquinhoados em espaço era o aguadeiro Hillel, filiado à Fraternidade Essênia, tido e havido com homem trabalhador, honesto e caridoso. Era celibatário e em sua casa, relativamente espaçosa e confortável (em relação às demais), hospedava conhecidos e amigos galileus, ligados a Jesus na crença da redenção prometida.
Na cidade rumorosa e superlotada de gente, Jesus não tinha pouso fixo e dormia, muitas vezes ao relento, no Monte das Oliveiras, rodeado de seus discípulos. Por isso ;e que dizia que: "os animais tem suas tocas, ,as o Filho do Homem não tinha onde repousar a cabeça'.
Passava os dias no Templo, pregando e consolando o povo, pois que, como rabi, tinha direito de fazê-lo no Pátio dos Gentios; e à tardinha, retirava-se para lugares diferentes e às vezes, mesmo, desconhecidos. Comumente se acolhia em casa de simão, chamado o leproso, pai de Lázaro, o que ressuscitou, no Bet-Ini, caminho da Betânia. Os próprios discípulos procuravam subtraí;-lo aos contatos com os agentes do clero para preservar-lhe a vida, tendo em vista que tanto sua pregação como seus atos colidiam muitas vezes com os costumes e regras determinadas pelo Sinédrio. Por isso é que, mais tarde, foi preciso que o sgan do Templo pagasse a Judas o segredo do lugar onde Jesus estava repousando, naquela noite trágica de sua prisão.
Como sacerdote do templo, membro do Sinédrio e homem de responsabilidades partidárias, não desejava Nicodemo que a visita a fazer a Jesus fosse divulgada e, por isso, pediu que fosse levado a Ele à noite, sem testemunhas e em lugar discreto.
Tendo o aguadeiro Hillel cedido sua casa, Nicodemo alo compareceu à hora marcada. Nessa entrevista (João 3: 1-21) Jesus demonstrou-lhe que o Espírito renasce várias vezes, evoluindo e não ressurge, simplesmente, uma só vez, como era admitido pelos fariseus; que evolui para conquistar, pelo amor e pela sabedoria, o reino de Deus. Mostrou que a transformação espiritual é o que importa obter e não as glórias efêmeras do mundo material; que o Espírito, liberto pela Verdade, é como o vento que sopra onde quer, que a salvação, fruto do renascimento espiritual, pertence a todos o homens, a todas as nações e raças e não a um só povo, de existencia previgeliada, mas de conduta comum, como era o caso dos Judeus respondendo as perguntas, referiu-se também à sua qualidade de Filho de Deus, destinado a um sacrifício redentor que em suas consequências, beneficiaria a toda a humanidade,
Após essa entrevista, o prestígio pessoal de Jesus cresceu muito na mente do Rabi, e disso deu relevantes testemunhos em outras oportunidade, principalmente no Sinédrio, tomando sua defesa, ou tentando restringir a hostilidade sacerdotal desencadeada contra Ele, sobretudo na noite de seu julgamento.
Edgard Armond - Livro O Redentor - cap 21
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