Texto para leitura - Por Thiago Bernardes - REVISTA O CONSOLADOR
48. O amigo de Jesus – Em determinado momento, com a bonomia que lhe é habitual, José Petitinga informou, dirigindo-se ao autor desta obra: “Como você recorda, hoje estamos recebendo a visita de querido amigo procedente de elevada esfera espiritual, que nos vem trazer palavras de levantamento moral e orientações para as tarefas que nos dizem respeito em relação ao futuro. O irmão Policarpo, que hoje nos honra com a sua presença, é mártir cristão, que ofereceu a vida ao Divino Mestre na arena romana durante uma das cruéis perseguições desencadeadas pelo imperador Diocleciano, por ocasião do fim da sua governança, no começo do século quarto da nossa Era. A sua implacável perseguição aos cristãos, que considerava como um grande perigo para o Império e para a sua autoridade, ceifou milhares de vidas mediante terríveis suplícios que lhes foram infligidos em todas as regiões por onde se espraiavam as suas províncias, sendo praticamente todo o mundo conhecido... Ante a rudeza das calamitosas refregas, não foram poucos aqueles que abjuraram a fé, rendendo culto ao imperador e aos deuses, provocando dilaceradoras angústias nas falanges dos servidores do Cristo. Aprisionado no norte da África, onde se celebrizara pelo verbo inflamado e pelas ações dignificantes de caridade e de amor, Policarpo foi enviado em ferros a Roma com a família – mulher e dois filhinhos – bem como outros discípulos do Rabi, sendo atirado às feras, num dos turbulentos festivais de loucura. Altivo e de ascendência nobre, em razão de ser romano de nascimento, foi-lhe proporcionado ensejo de renunciar à fé, retornando ao culto dos ancestrais, providência que pouparia a sua e a existência da família. Embora de alma dilacerada pelos sofrimentos que lhes seriam impostos, optou pela fidelidade à consciência, sendo martirizado com os seus. Conta-se que, antes de ser atirado à arena, em face da sua inteireza moral, por ordem superior foi supliciado pela soldadesca, enquanto a mulher e os filhinhos eram submetidos a humilhações inomináveis. Igualmente portadora de alta espiritualidade, Flamínia, a companheira digna, ao invés de atemorizar-se, mais confiou nos desígnios divinos, revestindo-se de coragem e de fé inquebrantáveis, que surpreendiam aqueles insensíveis algozes da sua firmeza moral. (Entre os dois mundos. Capítulo 2: O amigo de Jesus.)
49. Comovido pela evocação do testemunho desses
espíritos de escol, Petitinga fez uma pausa e, de
imediato, prosseguiu: “No dia em que deveriam servir de
repasto aos leões, leopardos e tigres esfaimados,
Policarpo foi jogado no meio dos companheiros
atemorizados, lanhado e esgotado nas forças pelos
flagícios sofridos, e, mesmo assim, tentou recompor-se,
para transmitir ânimo àqueles que, não obstante o amor
e a confiança no Mestre, choravam apavorados temendo o
próximo terrível testemunho que os aguardava. O
subterrâneo infecto por dejetos e cadáveres não
removidos tornara-se lôbrego e nauseante. Aqueles que
ali se encontravam haviam perdido praticamente o
discernimento e, hebetados uns pelo medo, agitados
outros pelo desespero, estremunhados diversos, vendo-se
abandonados, subitamente sentiram a mudança da
atmosfera, quando ventos inesperados que sopravam no
ardente mês carrearam o doce perfume dos loendros dos
arredores abertos aos cálidos beijos do sol. De
imediato, uma psicosfera de paz invadiu o recinto
sombrio e fez-se um significativo silêncio, enquanto o
rugir dos animais misturava-se à algazarra desmedida da
multidão agitada pelos corredores, assomando às
arquibancadas e galerias, aplaudindo o espetáculo
burlesco que sempre precedia às matanças desordenadas.
Foi nesse momento que o apóstolo, recuperando as
energias e inspirado pelos emissários do Senhor,
convidou o magote assustado à reflexão e à prece,
elucidando: – Morrer, por Jesus, é a honra que agora nos
é concedida. Enquanto Ele, que não tinha qualquer culpa,
doou a Sua vida, para que a tivéssemos em abundância,
convida-nos a que ofereçamos a nossa, a fim de que
outros, que virão depois, igualmente possuam-na. Morrer
por amor é glória para aquele que se imola. Enquanto o
mundo nos surpreende com as suas ilusões, sombras e
traições dos nossos sentidos, a morte é vida perene em
luz e felicidade. Não nos separaremos nunca! Avancemos
juntos, portanto, pois que o Mártir do Gólgota nos
aguarda em júbilo. O nosso sangue irá fertilizar o solo
dos corações, a fim de que se expanda a nossa fé,
modificando a Terra e elevando-a ao estágio de mundo
de reabilitação”. (Entre
os dois mundos. Capítulo 2: O amigo de Jesus.)
50. Conforme relatado por Petitinga, Policarpo fez então
uma ligeira pausa, dominado pela emoção que contagiava
os ouvintes atentos e, de imediato, prosseguiu: “- É
fácil morrer, especialmente quando se soube viver
transformando urze em flores e calhaus em estrelas.
Cantemos, dominados pela infinita alegria de doar o que
possuímos de mais valioso, que é a vida física. Jesus,
que nos ama, aguarda por nós!” A emoção era geral. Uma
aragem de paz tomou-os a todos. A esposa acercou-se-lhe
com um filhinho no regaço e o outro segurando-lhe as
vestes, e tocou-o. Abraçando-a com lágrimas, ele
agradeceu-lhe a coragem, prometendo que prosseguiriam
amando-se depois da sombra da noite... Os portões foram
abertos estrepitosamente. Soldados furiosos com lanças e
chibatas empurraram os prisioneiros para o centro da
arena. A gritaria infrene tomou conta da massa
alucinada, que subitamente silenciou, quando eles se
adentraram cantando um hino de exaltação a Jesus. Em
seguida, os animais selvagens foram atirados na sua
direção e, a pouco e pouco, as patadas violentas e as
dilacerações pelos dentes afiados foram despedaçando os
corpos, que tremiam exangues na areia, colorindo-a do
rubro fluido orgânico. Policarpo, a mulher e os
filhinhos, formando um todo em vigoroso abraço de
sustentação moral, foram alcançados e despedaçados...
Após as primeiras dores uma anestesia total tomou-lhes
a consciência e pareceram adormecer, enquanto o
espetáculo dantesco prosseguia... Embora remanescesse
débil claridade do Sol poente no áspero verão de
agosto, a noite avançava, deixando aparecer as primeiras
estrelas faiscantes como olhos que observassem as
inconcebíveis calamidades humanas. (Entre
os dois mundos. Capítulo 2: O amigo de Jesus.)
51. Dando prosseguimento ao seu relato, Petitinga
acrescentou que, quando a noite fez-se total, após o
público insano ter abandonado o Circo,
as feras serem recolhidas, os corpos começaram a ser
atirados sobre as carroças conduzidas por escravos
embriagados, vestidos de faunos e portando
comportamentos obscenos. Então, do infinito
incomparável, diáfana luz desceu na direção da arena,
servindo de passarela para uma coorte de seres angélicos
que, entoando sublimes canções, aproximou-se do lugar do
holocausto. À frente, estava Jesus, nimbado de sidérea
luminosidade, que recolheu Policarpo e família,
enquanto os demais martirizados eram retirados dos
últimos despojos pelos Seus embaixadores em clima de
alegria e gratidão a Deus. Despertando, e
deslumbrando-se com o Mestre que o envolvia em
claridades iridescentes, Policarpo abraçou-o, enquanto
Ele confirmou: – “Amigo querido, já transpuseste a porta
estreita. Agora vem com os teus para o meu Reino que
te espera desde há muito!” Petitinga então concluiu:
“Policarpo, depois daquela doação a Jesus, retornou à
Terra diversas vezes, sempre quando o pensamento do
Mestre sofria adulterações, sendo a sua última jornada
na condição de seareiro do Espiritismo, nele restaurando
a mensagem cristã que havia sido aviltada através dos
tempos. É
esse benfeitor, apóstolo do Evangelho, que nos honrará
com a sua palavra dentro de alguns minutos. Não posso
sopitar o anseio de ouvi-lo, de senti-lo próximo do
coração e aprender com ele o exemplo da doação total,
preparando-me para os futuros cometimentos”. (Entre
os dois mundos. Capítulo 2: O amigo de Jesus.)
52. Petitinga e Philomeno dirigiram-se, em seguida, ao
auditório onde ocorreria a palestra de Policarpo. O
local, cuja
capacidade era para quatro mil
espectadores,encontrava-se quase que totalmente lotado.
A psicosfera reinante era de contida alegria e de doces
expectativas. Em todos os rostos brilhavam os olhos que
expressavam as emoções em festa no mundo interior de
cada qual. Ali podiam-se ver muitos companheiros ainda
mergulhados na experiência carnal, convidados que foram
para o incomum acontecimento, assessorados pelos seus
mentores espirituais que os trouxeram, a fim de que retornassem
ao corpo com a memória do evento e das lições que iriam
ser oferecidas. Aragens perfumadas espraiavam-se em
todas as direções. Música suave de exaltação à vida
vibrava no espaço grandioso, alternada com vozes em
coral infantil, que enternecia os presentes. A claridade
reinante chamava a atenção, porque não provinha
especialmente de quaisquer instrumentos específicos
para produzi-la. Era como se todo o edifício fosse
construído de substância luminosa irradiante, enquanto
que, no local reservado aos visitantes e convidados
especiais, tornava-se multicor em suaves tons que
produziam bem-estar difícil de ser definido. Somente o
Amor de Deus – observou Philomeno – pode oferecer-nos
tão especiais oportunidades de iluminação e de
felicidade além dos convencionais interesses
transitórios do mundo físico. “As aquisições que todos
iriam amealhar teriam sabor de eternidade.” (Entre
os dois mundos. Capítulo 2: O amigo de Jesus.)
53. No recinto, aguardando a fala do orador convidado, o
irmão José Petitinga mergulhara em meditação, enquanto
seu semblante se adornava de peregrina beleza, o que se
podia observar em outros muitos espíritos ali
presentes, caracterizando os seus níveis de evolução.
Nenhuma bulha nem tumulto habituais em aglomerações de
tal porte. Todos estavam conscientes da responsabilidade
imensa do momento e de quanto lhes seria valioso
aproveitar cada instante para insculpir definitivamente
no coração e na mente a Mensagem de Vida Eterna que logo
mais seria ministrada. Os desencarnados presentes, que
aguardavam oportunidade para o retorno ao querido
planeta, que nos serve de colo de mãe generosa e onde
temos ocasião de aplicar as inabordáveis contribuições
do Mundo Maior, estavam conscientes do significado do
momento e do seu valor para seu aprimoramento pessoal
intransferível. Foi então que o responsável pela
solenidade apresentou-se, convocando a todos à recepção
do visitante especial – Policarpo, um dos mártires do
Cristianismo nascente. (Entre os dois mundos.
Capítulo 2: O amigo de Jesus.) (Continua...)
http://www.oconsolador.com.br/ano11/531/estudandomanoelphilomeno.html
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